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quarta-feira, maio 13, 2009

Last Recording


Sim estamos num museu

Eu te carrego há tanto tempo

E há tempo repito em minha cabeça: você

Ao alcance dos olhos, com este orvalho triste

A escorrer do seu corpo

Eu te carrego há tanto tempo

Chego a sentir o seu sangue correndo aqui dentro

Embora frios, congelados neste museu

Congelados numa expressão, na expressão que

Todos esperam ver

Eles nos observam

Será que sentem que estou velha?

Quanto tempo mais esperamos para que este museu desabe?

Por que isto é um museu

Estas pessoas a nos olhar

São velhas como um museu

Sim, velhas como um museu

Velhos conhecidos

Velhos turistas

Velhos artistas

Velhos sugadores de alma

Como um velho museu

Elas nos acompanham

Você ao alcance dos olhos

Esperando a minha voz

Mas somos estátuas, não somos?

Eu e você – uma Pietá gelada e preto e branca

Na cabeça das pessoas

O que elas esperam?

A minha benção?

Por que, se nada mais pode ser dito no espaço entre

A confissão e o arrependimento?

Por que,

Se os nossos valores foram tragados

Pela máquina fotográfica?

É proibido tirar fotos, sabia?

É proibido guardar este momento

No armário

Sabia?

(pausa)

eu te carrego há tanto tempo

não sou virgem coisíssima nenhuma

uma vampira, talvez

por beber o teu sangue inebriante

por durante tanto tempo.

Eles sabem

Os velhos sabem que eu preciso do teu sangue

Para continuar

“Continuar o que?” você me perguntaria

se fosse humano, se estivesse vivo

continuar o que?

Eles me querem viva

Por mais uma noite

Até que se apaguem todas as luzes deste museu

Estou cansada

Eles sabem

Estou cansada de te carregar

Eles sabem

Não sou santa

Também não sou de perdoar a todos

Não perdôo mais ninguém (eles que me perdoem)

Eles deverão carregar o fardo medíocre das suas vidas

Enquanto eu te carrego

Posso beber um gole?

Só um golinho?

Para aquecer as cordas vocais

Um golinho deste teu sangue

Deste sangue que me faz continuar

Por mais uma noite

Aqui neste museu

Eles querem que eu cante

Não se preocupe, não vou te abandonar

Você vai ficar na minha frente como um crucifixo

Na beirada da cama

Mais um gole e eu canto

Não pode falar no estúdio!

Shiiii, quietos!

Estou preparada para cantar

E depois morrer

Quem sabe.

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