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quarta-feira, abril 26, 2006

a morte, esta sacana (para Leprevost)

no final das contas
estaremos na mesma cidade-renite,
contando as mesmas histórias de sempre,
e com a nossa empáfia de sempre
acusaremos o T.S Eliot de bêbado.
diríamos coisas idosas do tipo:
"todo livro é útil por mais
que ele insista no contrário".
daí, certa hora ficaremos loucos,
como sempre ficamos em tantos costelões
e pediremos uma porção
com umas seis fatias de picanha gordurosa
e lembraremos de alguma frase de efeito
que o Tibério nos disse numa madruga qualquer.
colocaremos o Edson Falcão na vitrola,
sempre lamentando o fato dele não publicar mais poesia.
nos questionaremos "será que o Troy já casou?"
lembraremos do Thomas que, provavelmente,
ficaria resumido na frase "é, está bem"
e finalmente nos comparamos a algum poeta
que já possui uma cine biografia.
voltaremos com a mesma vontade de ir ao banheiro,
com o mesmo arroto ególatra de ter cumprido algum papel,
com um verso a mais na coleção de versos esquecidos,
com um arrependimento imbecil
de ter conhecido uma menina peitudinha,
com uma vontade de ir a um puteiro
e esquecer que um dia a gente se arrepende.
e dormiremos aliviados mais uma vez
ao lembrar que já fomos poetas um dia
e que achamos o final da noite uma bobagem
e que a morte, esta amiga sacana,
ainda não nos deu a sua carona final.
o estranho

então foi você
que aprendeu a gostar do que é belo
do respeito, da amizade e das coisas do coração
e com o tempo aprendeu a escrever
cartas de amor, sonetos de amor, declarações
e mais declarações.
você que treinou
por durante anos no espelho
a falar "eu te amo" para a sua menina
a comentar com ela as suas preferências
seus sonhos, manias e virtudes.
você que agora sozinho
consome feito um louco
as porcarias que sempre gostou de consumir na infância.
você que agora as consome só de raiva,
pois sabe o mau que um litro de coca-cola
e dois tabletes de diamante negro
fazem para o corpo.
você que ouviu ontem à noite Nina Simone
e chorou ao ser ninado num berço
cheirando a cigarro e insônia.
você que descobriu ontem que
a sua namorada só disse que gostava de jazz
para o agradar.
você que ontem
mesmo sem um puto na conta
insistiu em pagar o motel.
você que finalmente se deu conta que
o que a garota do verão de 99 queria
era que você a descabaçasse.
você que hoje se masturba com a mente vazia
e de olhos fechados.
você que sozinho rumina angústia e saudade
ao ler antigas revistas pornográficas.
você que hoje prefere beber sozinho
a insultar o próximo.
à você, este bêbado no banco de trás do carro
eu apresento este estranho
chamado você.

domingo, abril 23, 2006

Sono solitário

as pessoas têm dormido em portarias
em caros restaurantes, em almoços de família
com a família.
elas dormem em jantares de negócios
em filmes de quinta, em filmes de primeira,
em tecnicolor.
as pessoas têm dormido na avenida
na via rápida, no ponto de táxi, no ponto de ônibus
ou em qualquer ponto do mapa.
elas dormem em posições nada cômodas, acomodando nada,
sem nada incomodar, sem nada a perder ou a ganhar,
com tubos de insônia e apatia pelos buracos do corpo e da vida.
elas não falam, elas não gritam, elas não roncam.
elas dormem
por estarem sozinhas.
por acordarem sozinhas.
sozinhas.
sozinhas.

Imperdível



Dia 23.04 - 19 H
lançamento do livro:ODE MUNDANA
LUIZ FELIPE LEPREVOST
Ed. Medusa.
T R A V E S S Ã O - Livraria da Travessa
Rua Visconde de Pirajá, 572- Ipanema - Rio de Janeiro
Telefone: (21) 3205-9002

quinta-feira, abril 13, 2006

Meu amigo doente,
quem poderá saber que você
está assim?
E quem vai ouví-lo quando você
não conseguir dormir?
E que culpa as pessoas tem
de tudo isto?
Estarei ao seu lado, amigo.
Eu, um pedaço de sombra do seu passado.
Quem dita as regras da amizade?
Meu amigo doente, meu amigo,
você gostará de mim
mesmo que eu não morra contigo?

segunda-feira, abril 10, 2006

In my solitude...

Eu falo de uma loira
com um tribal tatuado no braço
a ouvir summertime
escorada num quadro da Billie Holiday
com um ar de arrogância
para os que não escutam
os longos improvisos da banda.
eu falo que ela bebia
algo transparente com limão
a propagar a cor da sua mão
a criar asas escuras
por entre as raras impressões de alívio
que o bar suspira entre uma canção e outra.
eu falo do seu olhar
e das estrelas mortas que ele carrega
um firmamento aquoso
onde bóiam as noites de solidão
(eu bebendo algo barato por ela
e formando uma família inteira
de versos parecidos com a gente).
eu falo desta que queima
a minha visão com a sua acidez
por que tudo que chapa é ácido
e as cores de uma beleza ácida
possuem vida própria.
eu falo desta mulher
com quem não quero conversar.
prefiro conhecê-la assim:
ouvindo summertime
escorado num quadro do Chet Baker
com um ar de arrogância
para os que não escutam
os longos improvisos da banda.

sábado, abril 08, 2006

Em troca de nada

Durante anos
Amei a puta
Que tirou o meu cabaço.
Amava como nunca amei a mim mesmo
O seu corpo, a sua voz, o seu cabelo
E até o cigarro que ela
Gentilmente me roubou.
No fundo ela era uma noite
Na constelação das noites todas
E eu, um pau a mais que ela
Era obrigada a excitar.
Mas de uma coisa eu não esqueço:
O morto do olhar a procurar
O oco da mente.
A solidão que soluçava de repente:
“vem cá, baby.
Fica comigo abraçado mais 5 minutos.
Apague esta luz e feche a porta.”
Ali eu entendi
O que é amar sem pedir nada em troca.

quinta-feira, abril 06, 2006

Pobre gerundismo

E quem perderia tempo lendo um blog que se ocupa apenas em condenar o gerundismo? Eu perdi. E, como um bom brasileiro que sou, resolvi tomar as dores desta pobre criatura. Gerundismo, apesar deste seu nome desgraçado, fiz uma carta de amor pra você e faço questão de usá-lo em meus próximos poemas. Lá vai:


Carta de amor ao Gerundismo

Gerundismo,
Estou amando cada vez mais
Você e esta sua dupla-hélice do “estar sendo”.
Você está me completando a cada minuto
E eu sei que a sua cara anda estando
Mais parecida com a cara do tempo
Do que as outras, no fundo.
Antes você do que outros vícios, como a ressurreição de línguas mortas,
Que os nossos preciosos vates tanto insistem em cometer.
Gerundismo,
Está chegando o dia em que gritaremos: “gerúndiooo!”
E arrombando portas, junto com as nossas amigas
“salada de pronomes, “repetição” e “rima em ar”
Estaremos comprando a briga dos vícios renegados
E assim viciando acadêmicos viciados em outras quinquilharias,
Estaremos tomando o nosso trago em qualquer esquina
E gerundiando sem a possibilidade de estarmos sendo incomodados.
Gerundismo,
Ando te amando assim: sujamente.
Te usando em versos em forma de coração
Embaixo de um teto de espelhos, entre uma
Ou outra declaração de amor.
Adoro estar enfiando o dedo nas suas terminações
E estar falando sempre deste jeitinho que não quer acabar.
Gerundismo, ah Gerundismo,
Você não precisa estar ficando assim tão triste.
Se eles não te usam mais,
Eles não sabem o que estão perdendo.

quarta-feira, abril 05, 2006

Douglas Kim e o seu humor afiado.

Tudo bem que eu sou fã da Scarlett Johansson, mas o Kim me fez ter cãibra na boca de tanto rir. Com licença grande Kim, mas serei obrigado a compartilhar com outros este texto. É do caralho.

EM QUEM VOCÊ PENSA DURANTE O BANHO?

(Douglas Kim)

"Enquanto milhares de onanistas pensam em Scarlett Johansson refestelada em seu apartamento de 1,95 milhas em TriBeCa, penso na Lurdinha. A Lurdinha não foi abençoada com um tronco anglo-saxão, mas mancava levemente da perna esquerda. Deitado na cama, eu sempre pedia para a Lurdinha buscar um copo d’água, mesmo sem sede, apenas pelo prazer de vê-la andar. Sob seus pés, o quarto parecia um campo minado. Um pezinho aqui, o outro ali, uma bamboleada, ah, a glória!

Falando em glória, tinha a Glorinha. Ela não mancava, mas tinha um odor sui-generis em sua axila esquerda. Agora me dei conta que as duas eram de “esquerda”. Não, nada fétido, algo mais parecido com aquele famoso prato chinês de ninho de pássaro que comi, certa vez, em Xangai. É verdade, pensando bem, talvez não fosse paixão, somente banzo por Xangai.

Mesmo após a invenção da pedicure – a maior invenção humana depois da mulher barbada -, a Ritinha se recusava a cortar as unhas dos pés. Um Zé do Caixão do avesso. Aquelas garras raspando em minha perna faziam uma depilação natural. Nunca esquecia de usar meião quando jogava futebol, temeroso que meus companheiros descobrissem minhas pernas lisinhas, lisinhas, e me comparassem ao David Beckham.

A Marizinha tinha o olho caído. Não me lembro se era o esquerdo ou o direito, a memória me trai, as lembranças se embaralham nesse momento nuno-leal-maiano. Em alguns dias, parecia o Victor Mature tentando fazer cara de mau; em outros, parecia o Amaral, jogador do Palmeiras. Ambas as situações eram horríveis. Adorava assoprar aquele olhinho enquanto ela tentava dormir. Aquela pele vibrando como se fosse asa de graúna, saia de Marilyn Monroe. Fuuu-fuuu.

As mulheres da minha vida. Todas soberbas, apesar do diminutivo dos nomes. Isso tinha uma razão: como os politicamente corretos gostam de dizer, eram todas 'verticalmente prejudicadas'."
Poema da semana (já que hoje irei beber um pouquinho)

Alcoólicas

V

Te amo, Vida, líquida esteira onde me deito
Romã baba alcaçuz, teu trançado rosado
Salpicado de negro, de doçuras e iras.
Te amo, Líquida, descendo escorrida
Pela víscera, e assim esquecendo
Fomes
País
O riso solto
A dentadura etérea
Bola
Miséria.
Bebendo, Vida, invento casa, comida
E um Mais que se agiganta, um Mais
Conquistando um fulcro potente na garganta
Um látego, uma chama, um canto. Amo-me.
Embriagada. Interdita. Ama-me. Sou menos
Quando não sou líquida.

Hilda Hilst

segunda-feira, abril 03, 2006

sempre quando encontro você
eu recebo você como quem vai receber
a notícia "estou grávida".
é por que sempre você
me carregou para o seu mundinho meg ryan
e eu tive sempre a certeza
de que o meu mundinho pelo menos
não estava em liquidação na seção de dvd's
das lojas americanas.
até por que
o único ser em que
atualmente gosto de passar a mão na cabeça
é a velha pincher marrom aqui de casa.
ela odeia visitas
e odeia quem insiste em conversar
com cachorros.

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