(ler o texto do Leprevost sobre o assunto para entender melhor o que foi falado)
(do Blog do Gilson Camargo)
Demorei para responder a este comentário, por que eu fiquei sabendo que ele existia apenas ontem, ao ouvir uma conversa do Sálvio com a Helena. Sálvio, da próxima vez comenta no meu blog para eu saber, ok?
30 de Julho de 2008 às 5:46
Sim, vi Final do mês. Vexado, mas vi, deliciado com a trilha, competente às pampas, sobrando, aliás, mais econômica que devia, na opinião deste crítico, com muita razão desacreditado. Mas com a Caludete tudo dá. E a Helena? Que choque vê-la assim, completa. Oxalá, Oxum, sei lá meu pai, a moça é talento puro. Quanto ao texto, o recurso ἀπὸ μηχανῆς θεός, o autor sabe bem do que falo (segredo nosso), e há pontualidade nesse falar, ao contrário do que argumenta o poeta Leprevost, não o aproxima de Brecht (nem precisaria, mas um argumento eloqüente contra essa possibilidade é o ataque à atendente bancária, duplamente vencida), ao contrário, o lançaria à comedia burguesa inglesa, se obtivesse manter a fina ironia, mas descambando ao farsesco caricatural, nos coloca entre a possibilidade do novo e a lógica do desencontrado. Sem estudo ou exercício a arte não anda.
Viu Gil, mesmo você(s) me devendo e não pagando, prestigio o seu blog, por enquanto.
1 de Outubro de 2008 às 16:06
Olá. Só para contrapor o que foi dito pelo Sálvio, acredito que este “Deus ex machina” (que o Sálvio colocou em grego) esteja na síntese Hegeliana que se dá entre a mãe e a filha que é na verdade o dinheiro. Ou seja, o Deus ex maquina - se é que realmente ele existe no "final do mês", já que é um elemento da tragédia grega - estaria no fato das duas aceitarem dinheiro roubado no final da peça (fato este que, como um bom Deus ex machina grego, vem amarrar toda a história), e não no pepino, no assalto ao banco, já que estas outras cenas seriam reflexos patéticos da primeira, cuja lógica nonsense (que já vem de uma outra época da história do teatro - mas isto eu deixo como lição de casa para o amigo, vide o que ele falou no final do seu comentário “Sem estudo ou exercício a arte não anda”) abre um espaço tanto à crítica, quanto ao encantamento. A aproximação com Brecht estaria, basicamente, com o fato da peça falar sobre dinheiro e também com o fato da peça utilizar em vários momentos recursos Brechtianos (as quebras, a filha falar sobre ela mesma, utilizando, para isto, o “nós”). Acho que quando você contrapôs o argumento do Leprevost, você estava falando no sentido temático, certo? Ou, mais precisamente, quanto aos rumos que a história da peça nos leva? Neste caso, lembre-se que a mãe está TRABALHANDO para sustentar a filha, e o fato dela não ter mais dinheiro para tanto (e as conseqüências disto), é, sim, uma aproximação com Brecht. É claro que não estamos num período de guerras, e a peça não entra neste contexto. A mãe e a filha não são pessoas miseráveis, que se desdobram para ganhar dinheiro e então comprar o "pão nosso de cada dia". Mas elas estão prestes a se tornar. O fato da falta de dinheiro levar a mãe a roubar comida do supermercado, cá entre nós, é bem Brechtiniano. O ataque à atendente bancária é veementemente rechaçado pela mãe (quando ela fala “minha filha é uma facista, uma ditadora” ou quando ela diz “isto é um absurdo: assaltar um banco só por que a atendente lhe tratou mal”) e não celebrado como um ato heróico - tanto que o discurso da filha desemboca no dilema de “devolver ou não o dinheiro”, que por sua vez desemboca no Deus ex machina do final. As pessoas que alí estão no banco são tomadas pelo discurso da filha e pela situação de incômodo de ficar horas numa fila; elas não são agentes da extrema direita que vieram destruir o papel da atendente bancária na sociedade. O ataque à atendente, na verdade, é o estopim do trágico, é a paralisia da classe média frente ao mundo que está aí, pedindo pressa e produção. Acho que o amigo não entendeu a peça. Acho que o absurdo dela (o pepino, o assalto ao banco, a maçã conversar com a mãe, etc) não leva apenas ao riso fácil e ao mero entretenimento (como você propõe quando fala sobre “farsesco caricatural”), mas sim a um estranhamento que (pelo menos na ótica de muitos espectadores que vieram falar comigo) leva posteriormente à reflexão. Respeito sua opinião, Sálvio, até por que somos amigos, mas gostaria imensamente que você assistisse a peça de novo para levar em consideração alguns pontos, que pelo que eu percebo, você não levou. É isto. Grande abraço