A arte de produzir efeito sem causa
Pequenos universos escondidos dentro de enclausurantes apartamentos do centro da cidade. O ar produzido pelo ar condicionado. As relações bizarras entre solitários. Tudo o que cabe em pequenos espaços. É disto (e sobre tudo o que vem disto) que trata o livro “a arte de produzir efeito sem causa” de Lourenço Mutarelli. Como em seus outros livros, aqui a história também se passa num micro universo: um apartamento no centro da cidade de São Paulo. Junior, depois de descobrir um terrível segredo que o levará a abandonar a mulher, o filho e o emprego ao mesmo tempo, resolve passar um tempo na casa do pai, que Mutarelli apelida de “Sênior” (recurso também utilizado em “Jesus Kid”. Neste caso também as personagens ganham apelidos a todo o momento). Lá ele conhece Bruna, uma estudante de artes que é supostamente observada por Sênior através de um buraco na parede. Sem dinheiro, sem emprego e sem nenhuma perspectiva, Junior não encontra saída, uma vez enterrado em sua rotina que se resume a goles de cafés, maços de cigarros e decidas no bar da frente de seu prédio. Ele é mastigado pelo ambiente e pelas lembranças atormentadoras de sua mulher e de uma bizarra traição.
Nunca havia experimentado a leitura de um livro que falasse de uma forma tão simples, seca e ao mesmo tempo profunda sobre a solidão e sobre a imobilidade que às vezes nos abate através da rotina e do acomodamento. “A arte de produzir efeito sem causa” fala sobre abandono, mas o leitor só se dá conta disto depois, com o escorrer das páginas. É só depois de se estar enterrado (como Junior também parece estar) e completamente envolvido pelo enredo que se percebe que aquele livro fala sobre solidão, abandono, falta de dinheiro, falta de perspectiva e, finalmente, inanição. Li numa noite. Numa sentada. Confesso que fiquei realmente obstinado pelo livro.
Enfim, depois disto estou curioso com relação à filmagem do livro “O natimorto”, produção que contará com a atuação do próprio Mutarelli e com a deslumbrante Simone Spoladore.