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segunda-feira, janeiro 29, 2007

Sim, o Vinícius era mestre

chega uma hora que esse tipo de música faz bastante a diferença quando se quer entender certas pessoas.


Canto de Ossanha

Vinicius de Moraes / Baden Powell


O homem que diz "dou" não dá

Porque quem dá mesmo não diz

O homem que diz "vou" não vai

Porque quando foi já não quis

O homem que diz "sou" não é

Porque quem é mesmo é "não sou"

O homem que diz "estou" não está

Porque ninguém está quando quer

quarta-feira, janeiro 24, 2007

Improviso





Ela vem solando uma
Guitarra Stratosonic Gianini
Eu já com uns quarenta anos
Ela ainda com os cabelos em movimento
Eu bebendo um rabo-de-galo
À beira-mar do asfalto
Ela me estendendo a mão
Sussurrando em alto e bom som
“você me perdoa?”
Eu , já sem esperança , entrego
Cerimoniosamente, o meu último
Bem de valor
Uma Gibson Les Paul
Com a corda mi estourada

terça-feira, janeiro 23, 2007


Voltando ao tempo das armas brancas (depois de ler a capa de uma tribuna e lembrar daquela cena do corredor de sangue)

Um cheiro de borracha queimada
E enxofre num quarto pós-morte
O pai declara num último gole
De saliva e lábios moles:
“você não é profunda só
por que o seu mapa astral disse”
“você é incapaz de me entender”
Retruca a filha retorcendo
A velha tramontina enferrujada
Na barriga do velho bêbado
Os paramédicos do inferno
Aplaudem o espocar de uma
Chandon de sangue, enquanto
As carpideiras recolhem os trocados
De algum circo de horrores

quinta-feira, janeiro 18, 2007


foto: Mert Alas e Marcus Diggott

Natalie Portman

até pensei em dar um beijo na sua foto
como se fosse a sua testa, ou o pé
de uma santa padroeira de
alguma cidade seca e deserta
onde a coca-cola é vendida a dez reais a lata
e a água, quando vem, deságua através de reza
pensei numa barra de chocolate com
as frutas cítricas arrancadas e o açúcar
cristalizado derretendo na ponta dos meus dedos
pensei em cortar a luz da cidade
para que a procissão de velas nos apartamentos
soprasse a meia-luz que a sua imagem merece
entoando velhas cantigas de ninar
parodiando com o seu nome, com o seu corpo
todo o verso que falasse a respeito de “sonhar com os anjos”
por que os barulhos de pratos raspados, copos cica
e toalhas no piso do banheiro me irritam a medida
que sinto na temperatura elevada do meu corpo
a escuridão que a falta de embriagues provoca
em um homem que sabe, por acordar
sempre após ao meio-dia,
que a beleza de uma mulher só é explícita
quando a maquiagem está nitidamente borrada.

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Paulo de Tharso

Na primeira viagem que fiz pra sampa com o Leprevost nós conhecemos um dos caras mais figuras de todos os tempos: o Paulo de Tharso, grande xadrinista e vocalista de rock. Descobri no blog do Mario Borttoloto que o cara, além de ser uma grande figura da Roosevelt, é poeta também e dos bons. Grande Paulo.

Minha Alma Pequena

Eu só queria ficar em paz.
Deitado, sob a sombra da árvore que eu não plantei.
Acariciando os cabelos da cabeça do filho que eu não fiz, e que estaria repousando sobre o meu peito.
Eu só queria dormir pra sempre.
À beira de um riacho, sob a sombra de um pessegueiro.
Sonhar com a Abissínia, mas voltar ao Egito de onde eu nunca deveria ter saído.
Eu só queria fazer uma revolução.
E matar todos os opressores da Palestina, de Israel, dos E.U.A, e matar os caras encapuzados da K.K.K
Eu queria traficar armas e drogas para abastecer de dólares e Euros todas as revoluções da África e do Cone Sul.
Eu queria ter ido para a Nicarágua, trabalhar nos campos e fazer guerrilha, quando aquela puta francesa me abandonou só, no Vidigal. Tinha um anúncio no jornal, pedindo voluntários. Mas eu tinha um show na semana seguinte, e não fui.
Eu queria ficar quieto, em um canto, chorando baixinho, escutando Cartola, bebendo até morrer.
Aprender a falar com os animais, como fazia Yan, um húngaro que foi caseiro no sítio de minha avó. Quando a tarde despencava, ele estalava a língua e balbuciava qualquer coisa, fazendo com que as galinhas voltassem para o poleiro.
Depois, eu evoluiria e aprenderia a falar com as plantas e com as pedras.
E depois.... Eu juro, me calaria para sempre.

Eu só queria um pouco de alegria
E continuar desafiando a polícia e apedrejar suas viaturas, como fiz outro dia. Só pra me lembrar.
E ir pra Havana beber rum ordinário e pedir ao Pedro Gutiérrez que me apresentasse àquelas mulatas, que bebem e trepam o tempo todo. Sem culpa.
Eu só queria um pouco de poesia negra num prato de Cachopa.

E não ter que me levantar todos os dias.
Pra não ter que encarar o sol podre e tentar me convencer de que tudo vale a pena.
Não vale! E minha alma não é pequena. Meu coração é que está apertado.
E não ler nunca mais os jornais, para constatar o que eu já sei desde meus 10 anos.
De que o mundo não tem jeito. De que tudo é uma brincadeira sem graça do criador.
Eu só queria que deixassem em paz, essa Terra. Essa puta com olhos abstratos, que continua germinando plantas e flores delicadas.

Paulo de Tharso

segunda-feira, janeiro 15, 2007

voltando pra Curitiba

então guria
é exatamente esta impressão:
delicado como um cigarro
aceso na garoa
ou como a Bruna Beber
rasgando o sulfite
ao escrever com uma bic
sem tinta

um chaveiro roubado do Mickey
perdido num porta moedas
um pedaço de bolacha Maria
boiando no leite desnatado

é como dar um tchau
pra alguém que não o reconheceu
é como matar uma mosca
com a ponta de uma tachinha
é igual a falar "eu te amo"
em troca de alguns trocados
a mais.

terça-feira, janeiro 09, 2007

eu velho

Me imagino um velhinho
sozinho decorando pequenos gracejos
que eu falaria na porta de um destes
cafés do centro.
Com uma dispensa cheia de velhas bebidas
todas elas me deixando ainda mais velho
com uma sala de estar vazia
a me deixar ainda mais só
como um objeto de decoração ultrapassado.
me imagino um velhinho
contando a idade como se fosse pontos
de uma competição onde se ganha
aquele que morre mais cedo.
citação do mês

"Não precisamos de gênio, o gênio está morto. Precisamos de mãos fortes, de mentes dispostas a desistir do fantasma e criar carne".

Henry Miller (Trópico de câncer)

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